sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

O Estado do Rio de Janeiro e a discricionariedade da covardia

O Estado do Rio optou por pagar as categorias que recebem mais em detrimento das que recebem menos. Isso não é especulação, mas fato real já comprovado. Foram pagos os vencimentos de novembro, dezembro e o décimo terceiro daquelas categorias que, em boa parte, têm total capacidade de defender-se, enquanto os pequenos sequer receberam a remuneração do mês de novembro de 2016 em pleno meado de janeiro de 2017.

Sejamos claros: um agente público que receba entre quinze e trinta mil reais, por exemplo, tem condições de chegar a qualquer agência bancária e contrair responsavelmente um empréstimo, caso necessite. Isso se não puder sacar de sua própria conta corrente ou baixar recursos de suas aplicações financeiras.

Já a grande massa de aposentados e aqueles que recebem remunerações bem mais baixas estão sem condições para comer e pagar pelas necessidades mais básicas (energia, saúde, água, higiene, escola, aluguel...). Também não conseguem empréstimos, porque não lhes têm sido concedidos pelas instituições financeiras precisamente em razão da situação financeira do Estado do Rio. Um verdadeiro filme de terror.

Não houve a veiculação de qualquer motivação das autoridades ou dos representantes das categorias privilegiadas acerca da opção de proteger aos que menos precisam de ajuda. Tudo tem sido feito debaixo de um silêncio frio, mas eloquente.

Alguns ainda tentam justificar dizendo que muitas das instituições do Estado que pagaram até o 13º utilizaram os recursos dos seus próprios fundos. Ora, os fundos são instituídos por lei e não podem ser utilizados para pagar vencimentos.

No entanto, já que iria se descumprir a lei ao custear a folha de pagamento da instituição com recursos dos próprios fundos, então por que não descumprir a lei promovendo a partilha? Se reunindo os recursos disponíveis de fundos, contas e caixa do tesouro o Estado só tivesse cinquenta reais para pagar a cada um, que assim se partilhasse. Era necessário repartir o pouco, especialmente, com quem mais necessita. Não se trataria de mera divisão aritmética, mas de partilha, que é muito mais que uma conta de divisão. 

Entendem a dimensão da partilha aqueles que sabem que cem reais poderão significar a mesa posta para a família de quem ganha pouco. Aliás, Jesus Cristo trouxe eloquentes lições sobre o fenômeno da partilha.

Do ponto de vista jurídico, a escolha de efetuar os pagamentos da categoria dos mais abastados em detrimento das menos favorecidas violou frontalmente a Constituição. Do mesmo modo, as decisões judiciais que determinam arrestos para determinadas categorias, instituições ou poderes sem observar a situação real de escassez para aplicar a isonomia e a proteção dos mais frágeis também violaram a Constituição. 

Todos são erros desumanos e irreparáveis. Erros que comprovam, de uma vez por todas, que não existe no Brasil a chamada Constituição fraternal, que protege as minorias e os mais fracos (talvez o ex-ministro Carlos Ayres Britto necessite reescrever sua Teoria da Constituição que comenta sobre o constitucionalismo fraternal).

A verdade é que a situação caótica turva a visão. Dificulta entender como as coisas estão se passando e onde estão os cometimentos das barbaridades no campo técnico-jurídico. Tento recobrar a serenidade para explicar a minha leitura da situação.

A efetivação do pagamento de remuneração de trabalho é um dever de natureza vinculada. Trabalho sem remuneração é trabalho escravo. É direito humano. Irrenunciável, assim como os proventos de aposentadoria. Portanto, não há espaço para a aplicação do juízo de conveniência e oportunidade quando se fala pagamento da remuneração do trabalho.

No entanto, como no momento os recursos não alcançam para cobrir a toda a folha de pagamento, o gestor público foi obrigado a fazer escolhas. É neste ponto que aquela situação que era vinculada converteu-se em discricionária por força da escassez. Noutros termos, abriu-se à fórceps um espaço para avaliação da conveniência e oportunidade em razão da incapacidade do Estado de atuar de modo vinculado. O Estado, então, passou a fazer escolhas.

Como se constatou, as escolhas do Estado favoreceram ainda mais aos que menos precisam de ajuda, seja no exercício da função administrativa, seja na jurisdicional ao julgar os casos que lhe são postos sobre o tema. Portanto, o Estado optou pela covardia.

Já sabemos que é ineficaz elencar os dispositivos violados da Carta da República, mas, por teimosia e dever de consciência, se pode lembrar daqueles que tutelam a dignidade da pessoa humana, o mínimo existencial, a moralidade, a isonomia, a proteção do trabalho, das crianças, dos idosos, dos deficientes, dos cidadãos de baixa renda, entre outros. Isso sem falar na configuração de ato de improbidade, crimes comuns e até mesmo crimes de responsabilidade, aqui sim, sobejamente configurados.

domingo, 9 de outubro de 2016

A presunção de inocência deixou de ser proteção da liberdade individual?



As Ações Diretas de Constitucionalidade - ADCs 43 e 44 foram propostas para obter uma declaração do STF de que o art. 283 do Código de Processo Penal é constitucional.

O referido artigo garante que a prisão só pode acontecer em flagrante, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória ou nos casos de prisão temporária ou preventiva:

Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Até ontem eu achava que os incisos LVII e LXI da Constituição falavam a mesma coisa que o art. 283, do CPP, quase que literalmente:

“LVII — Ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

“LXI — Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (...)”.

A decisão do STF, por maioria (6x5), declarou a constitucionalidade do artigo 283, mas desde que se faça uma “interpretação conforme a Constituição” do artigo. 

A chamada “interpretação conforme” é um recurso usado para salvar um texto normativo que, em princípio, sua interpretação se coloca contra a Constituição. É um recurso para converter uma interpretação inconstitucional em constitucional. Portanto, tem-se um pressuposto lógico imprescindível para a utilização da “intepretação conforme”: a preexistência uma interpretação que contrarie a Constituição.

Então, o que está contra a Constituição para que seja necessário dar uma “interpretação conforme”?

A única hipótese é considerar que a vedação feita pela CF (ninguém será culpado até o trânsito em julgado...) nada tem a ver com o efeito da decretação definitiva da culpa, que é a privação da liberdade, ou seja, não se trata de proteção da liberdade.

Tomada assim a questão, o inciso LVII da CF estaria protegendo alguma outra coisa que não a liberdade individual. O que seria? Para que serviria dizer que o acusado ainda não é culpado se pode ser encarcerado caso a sentença de segundo grau se confirme?

O Ministro Gilmar disse que o sistema oferece meios de corrigir a situação se se concluir pela inocência do acusado, que foi preso após decisão de segunda instância. Com isso, segundo parece ao Ministro, fica “resolvida a questão” (??). Sem comentários.

Prefiro o entendimento anterior do Ministro, excelente constitucionalista, quando fez duras críticas a prisões arbitrárias com a invocação da Constituição como protetora das liberdades individuais.

Enfim, o STF entendeu que o art. 283 do CPP estaria em desconformidade com a CF ao não admitir, além das hipóteses que indica, a prisão decorrente de uma decisão condenatória confirmada em segunda instância.

Essa racionalidade é a confirmação de que o STF passou a entender que a presunção inocência é apenas um privilégio dos acusados e não a proteção da liberdade individual. Por isso, segundo a maioria do STF, o melhor foi flexibilizá-la porque “a comunidade quer uma resposta, e quer obtê-la com uma duração razoável do processo”.

Muitos aplaudiram. A Revista Época, por exemplo, fez uma capa em que exaltou a medida em nome do combate à corrupção. No entanto, protestou quando o juízo da 12ª Vara de Brasília determinou a quebra do sigilo telefônico de um jornalista para a identificação da fonte. Invocou tratar-se de violação de um direito fundamental.

Há duas formas de se reconhecer a importância da proteção inflexível dos direitos fundamentais: pelo entendimento, que requer abertura de espírito, humildade e superação da paixão política; e outra pelo medo, que fará com que a pessoa clame em alto e bom som: “chame o meu advogado, por favor”.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

A falácia do "julgamento político", por Grevi Netto



Quando estudiosos e interessados pela ciência jurídica apontam os diversos problemas no julgamento do impeachment, geralmente recebem, como resposta, o argumento do "julgamento político".

Os que utilizam este argumento batem no peito com orgulho, como se fosse a panaceia argumentativa que salvaria a sua oculta vontade de ver um governo que detestam (por diversos motivos, exceto um que justifique o circo em andamento) cair, caindo também tudo o que este tipo de governo representou, em âmbito sócio-econômico.

Mas o argumento sobrevive a uma filtragem constitucional e lógico-semântica?

Quando falamos em julgamento e processo, todos eles, assim como todo o ordenamento jurídico e seus ritos, submetem-se à vontade da Constituição da República. E o que diz a Constituição da República? Muitas coisas pertinentes ao tema, como tentarei expor no rol exemplificativo abaixo:

1) Começo pelo princípio constitucional da jurisdicionalidade, aplicado ao Processo (tanto o processo penal quanto o processo administrativo sancionador). Sobre a jurisdicionalidade, atenho-me ao seu aspecto "imparcialidade", em especial a imparcialidade subjetiva dos julgadores (Piersack/82 e De Cuber/84, Tribunal Europeu de Direios Humanos).

Essa imparcialidade, em nosso ordenamento, decorre da adoção do sistema acusatório, isolando o julgador a um papel de observador - terzietà - garantindo a sua imparcialidade (sistema acusatório, como leciona o professor Aury Lopes Júnior, pressupõe a titularidade da ação por parte de um acusador; contraditório e ampla defesa; devido processo legal; presunção de inocência; exigência de publicidade e fundamentação das decisões judiciais) e da recepção do Pacto de San Jose da Costa Rica, com o seu artigo 8, e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, com seu artigo X.

Como pode um processo acontecer quando os julgadores estão claramente contaminados por vontades políticas, inclusive com alguns já declarando o seu veredicto, antes do término da fase de produção de provas? Que julgamento é esse em que os julgadores, em vez da isenção, aliam-se à acusação? Voltamos à inquisição? E aqui entra a panaceia: "trata-se de julgamento político".

Não é assim que funciona. Esta falácia não pode se sobrepor à Constituição. É o processo que deve se adequar aos dispositivos constitucionais e não o oposto. Não se deve afastar a incidência das regras constitucionais pela conveniência do momento. São garantias de todo e qualquer cidadão, incluindo aí os interlocutores que se utilizam da panaceia

2) No segundo ponto, aponto a absurda e flagrante violação ao princípio constitucional do contraditório, aplicável a todo e qualquer processo, com uma história exemplificativa: Imagine que você, na etapa da produção de provas testemunhais (em juízo, por óbvio), depara-se com a ausência do julgador da sala de audiências. A pessoa que deveria estar presente na produção da prova, para analisá-la e decidir por base em todas as provas produzidas, não está presente para ouvi-lo. Absurdo, certo? É o que aconteceu na sessão de julgamento do processo de impeachment.

E quando falo em contraditório, não é apenas a formalidade de ser dada a chance para a apresentação da versão e produção da prova. Isso seria, tão somente, uma maquiagem jurídica para dar ares de legalidade ao processo. Não afasta, de forma alguma, o caráter golpista da trama em andamento.

O contraditório deve ser respeitado, também, em seu aspecto material: a chance de ser ouvido, de ter a sua versão considerada, no momento do convencimento do julgador. A chance de influenciar no resultado do processo. Pergunto-lhes: há alguma chance?

Que contraditório é esse em que os julgadores ausentam-se no momento da oitiva das testemunhas de defesa? Violação flagrante do contraditório e, por consequência, do devido processo legal. Completamente antidemocrático. Não se sustenta a argumentação de que é "um julgamento político" para isentar-se da responsabilidade de observar a norma constitucional.

Por último, prezando pela objetividade do texto, sugiro uma reflexão do ponto de vista lógico-semântico da expressão "julgamento político.

Se é julgamento, não pode ser político. Considerando certos elementos das acepções da palavra "política" por Hobbes e Bertrand Russel ("obtenção de vantagens" e "alcançar efeitos desejados"), temos uma inegável presença de interesses subjetivos, o que leva à contaminação do "julgamento", obrigado a respeitar princípios constitucionais de procedibilidade, em especial a jurisdicionalidade, em seu aspecto de imparcialidade. Trata-se de cristalina contradição. Aceitar a existência desse termo para justificar todo e qualquer abuso é atentar contra normas constitucionais (formais e materiais), tornando todo o processo uma farsa ainda mais antidemocrática.

O julgamento do impeachment é FEITO por políticos, mas estes estão submetidos à observância dos princípios constitucionais e das normas constitucionais formais e materiais. E não deve proceder a argumentação de que o processo seguiu as normas constitucionais invocando os artigos que referem-se diretamente ao impeachment, considerando que deve ser respeitada a Constituição como um todo, inclusive o seu "animus" e os princípios implícitos, decorrente da interpretação teleológica, e não apenas os dispositivos convenientes para os interesses políticos.

A adoção deste argumento como panaceia argumentativa só demonstra a fragilidade em rebater todas as nulidades e ilegalidades cometidas durante o processo do impeachment.

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

El impeachment en Brasil: un reto para la seguridad jurídica y la democracia brasilera



El impeachment previsto en la Constitución de la República de Brasil es el instrumento jurídico-político por medio del cual se puede provocar la pérdida del mandato del Presidente de la República.

A los efectos de iniciar el proceso al Jefe de Estado, el artículo 85 de la Constitución requiere un presupuesto jurídico: la comisión personal de un “crimen de responsabilidad” por parte del mandatario. Este requisito no es político. Una vez configurado el requisito jurídico se puede aplicar el juicio político.

Abogar la tesis de que es un juicio puramente político convierte el impeachment en recall (moción de desconfianza), lo que no sería posible en el sistema presidencialista brasilero.

El mismo artículo establece que tales crímenes serán definidos en ley especial. En este caso, se trata de la Ley 1.079/1950. Una de las figuras típicas de la Ley involucra la violación de la ley presupuestaria.

La petición inicial del impeachment es considerada inicialmente por la Cámara de los Diputados federales y, en caso de no ser rechazada, pasa al Senado de la República para el procesamiento y juzgamiento del Jefe del Poder Ejecutivo.

En el caso actual de Brasil, la denuncia no fue rechazada por la Cámara. Siguió para el Senado que tampoco la rechazó. Actualmente, ha comenzado el proceso en el Senado que será conducido por el Presidente de la Suprema Corte de Justicia del País.

La formulación del pedido de impeachment de la Presidente Dilma se basó en dos conductas:

1. La emisión de decretos que abrieron créditos adicionales (julio y agosto de 2015) para suplementar determinados rubros presupuestarios, cuyas asignaciones originales no fueron suficientes.
Según la denuncia, tales decretos fueron hechos sin autorización previa del Congreso Nacional, siendo incompatibles con la meta fiscal primaria definida por una de las leyes presupuestarias. La autorización legal para la apertura de créditos adicionales existió, pero estaba condicionada a la compatibilidad con el alcance de la meta fiscal. Con esta conducta, la Presidente Dilma habría violado la Ley presupuestaria, lo que caracterizaría un crimen de responsabilidad, conforme consta en la denuncia.

2. El retraso del desembolso por parte de la Unión Federal para el “Banco do Brasil”, que es el ejecutor del “Plano Safra”. Este programa gubernamental se refiere al otorgamiento de subsidios a la actividad agrícola. El Banco realizaba los pagos a los agricultores, aún existiendo retrasos de la Unión.

El incumplimiento del plazo, según los términos de la petición, ha configurado una operación de crédito del gobierno con el banco federal, la cual está prohibida por la Ley de Responsabilidad Fiscal brasilera.

La acusación reconoció que el referido programa es gestionado por el Ministro de Hacienda y por el Secretario del Tesoro, pero afirmó que la Presidente mantenía reuniones frecuentes con aquellas autoridades y, en caso de no haberse determinado el retraso de los desembolsos para “maquillar” la contabilidad, por lo menos habría actuado de manera omisiva, al no exigir que el Ministro y el Secretario cumplieran la Ley.

Ahora bien, con referencia a la emisión de decretos presupuestarios de suplementación, la petición incurre en una grave confusión entre la gestión presupuestaria y la fiscal o financiera. Con la apertura de créditos suplementarios no es posible incumplir la meta fiscal o comprometerla, pues esta se cumple en la ejecución financiera, que es un plano distinto de la programación presupuestaria.

No es por otra razón que, en el curso de la ejecución financiera, la percepción de que la meta fiscal primaria no podrá ser cumplida a fin del año obliga al Jefe del Executivo – por determinación de la propia ley – a firmar decretos de contingencia que impiden la realización de pagos en la caja del tesoro público. La situación de contingencia vale hasta que el nivel de ingreso de recursos pueda volver a la normalidad.

En otros términos, lo que queda bloqueado es la ejecución del pago y no la posibilidad de alterar la programación presupuestaria para los distintos rubros. Además, todos los créditos abiertos presentaron las respectivas fuentes, conforme determina la ley, por los propios órganos solicitantes. Uno de ellos fue el propio Supremo Tribunal Federal.

El gobierno de la Presidente Dilma adoptó todas las medidas concretas de contingencia de los gastos, incluso lo hizo en el propio mes de julio de 2015 dos veces. Por lo tanto, desde el punto de vista jurídico, no hubo incumplimiento de Ley presupuestaria.

El problema es que, después de más de 15 años, la Corte de Cuentas cambió su interpretación. Según este nuevo entendimiento, en caso de que la proyección fiscal pueda indicar una dificultad de cumplir la meta a fin de cada año, el gobierno quedaría impedido de promover cambios de la programación por medio de créditos adicionales.

Sin embargo y aunque sea impracticable el nuevo entendimiento de la Corte de Cuentas, la publicación de la decisión fue en octubre de 2015, pero aplicable a los decretos editados en julio y agosto del mismo año.

En definitiva, hubo cambio jurisprudencial aplicable a hechos anteriores con violación directa al principio de la seguridad jurídica y también a la determinación literal de la ley de procedimientos administrativos federales (Ley 9.784/1999, artículo 2º, párrafo único, numeral XIII) que prohíbe la aplicación retroactiva de nueva interpretación de la ley.

Sobre el retraso en el desembolso en el Plano Safra, no hubo una conducta concreta de la Presidente da República. No hay crimen sin conducta. Los actos de ejecución del dicho programa no estaban a cargo de ella, tampoco el pago. El hecho de formar parte de las reuniones no configura capacidad jurídica de transferir responsabilidades de eventuales conductas ilegales. Se trata de un entendimiento elemental en el campo del derecho sancionatorio. Además, en razón de la imposición explícita de la ley, la fiscalización del programa estaba a cargo del Banco Central de Brasil y no de la Presidente, de manera que ni siquiera de omisión dañosa se puede acusarla.

No obstante, el retraso de los desembolsos del gobierno para la institución financiera no puede ser transfigurado en operación de crédito. El retraso es un incumplimiento de determinación legal que sujeta a los infractores a los efectos legales propios (interés, multas, sanciones administrativas). No es posible, desde la perspectiva jurídica, admitir la transformación del incumplimiento de una obligación legal en una relación jurídica bilateral de préstamo, que sería una nueva relación de derecho.

Frente al cuadro de fragilidad jurídica de la denuncia para proponer el impedimento de la Presidente electa por el voto directo de la población brasilera, la petición ya debería haber sido rechazada. Los elementos objetivos que imponen el reconocimiento de la falta de “justa causa” para seguimiento del proceso.

Con todo, dos fases ya fueron superadas sin rechazo de la petición de la denuncia, lo que nos preocupa sobremanera.

En el caso de concretarse el retiro de la Presidente del cargo con base en la denuncia propuesta, dos principios serón peligrosamente violados en Brasil: el de la seguridad jurídica y, fundamentalmente, el democrático. Y, seguramente, tendrá consecuencias gravosas para el futuro del País y de la región.

El remedio para los malos gobiernos es el voto y no la articulación de un artificio jurídico que rompa la institucionalidad democrática.