sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O princípio da motivação e a LC 131/09

O princípio da motivação é aquele que determina ao Administrador público a exposição dos fatos e dos fundamentos de direito que o levaram a expedir um ato ou firmar um negócio jurídico público, isto é, determina a comunicação do motivo. Já produzimos comentários neste blog sobre o princípio da motivação quando tratamos da possibilidade da “motivação aliunde” no ato administrativo eletrônico. Naquela oportunidade, traçamos, em linhas gerais, o perfil deste princípio nos itens 1, 2 e 3 da postagem. Para relembrar, veja aqui o texto completo.
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Visto o que é a motivação e a sua obrigatoriedade, sob pena de vício de legalidade, pergunta-se se os dados a serem disponibilizados nos sítios eletrônicos oficiais por força da LC 131/09 devem conter a motivação.
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Para responder adequadamente à questão, relembro também que já comentamos que os “dados” relativos aos atos e contratos administrativos (e seus assemelhados) devem ser disponibilizados, mas sem detalhar quais, especificamente, seriam eles. Apenas consignamos que seriam as “informações sobre os atos jurídicos que deram origem às despesas” com o acréscimo de que não poderiam faltar o número do processo, o fornecedor, o objeto, entre outros (ver aqui).
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Ora, se a finalidade maior da Lei é permitir que o cidadão possa exercer um controle mais eficaz das receitas e dos gastos da Administração Pública, tal controle restaria prejudicado sem a disponibilização da motivação dos atos geradores das despesas. Não há como avaliar a adequação da despesa (especialmente as decorrentes de atos de competência discricionária) se não se conhece as razões de fato e de direito que levaram a realizá-la.
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Diante do exposto, ratifico que o correto cumprimento da LC 131/09 implica publicação eletrônica não só do conteúdo do ato (ou negócio), mas especialmente de sua motivação. A não disponibilização da motivação junto do ato correspondente comprometerá a validade do ato expedido ou negócio firmado.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

E as entidades da Administração Pública indireta no contexto da LC 131/09?

A questão merece detida análise, especialmente tendo em conta que há duas categorias de entidades que compõem a Administração Pública indireta: as detentoras de personalidade jurídica de direito público (autarquias, fundações autárquicas, alguns consórcios públicos) e as de direito privado (empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas de direito privado e alguns consórcios públicos).
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Em primeiro lugar, há um dever comum entre todas aquelas entidades que são tratadas como unidades orçamentárias pelas respectivas LOAs: devem utilizar corretamente o “sistema integrado de administração financeira e controle”, referido pelo art. 48, p.u., III, da LC 101/00, com a redação que lhe deu a LC 131/09, que deverá ser criado (ou adaptado a partir dos já existentes) para cumprir as novas regras da transparência estatal. Note-se que não há como afastar as entidades da Administração Pública indireta da utilização desse programa informático, pois, sem isso, não haveria a possibilidade técnica de disponibilização de dados em tempo real tal como exigido pela Lei. Enfim, sem a utilização do programa, a disponibilização de dados seria, indubitavelmente, em tempo posterior, o que desatenderia a Lei.
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De outro lado, haverá a distinção de tratamento para as entidades do Estado que detiverem personalidade jurídica de direito privado e explorarem atividade econômica, pois a Constituição Federal determina que se submetam ao regime jurídico próprio das empresas do setor privado (art. 173, § 1º, II, CF). Veja-se em seguida.
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A referida dicção constitucional deve ser lida com cautelas, pois a tais entidades exploradoras de atividade de direito privado recaem também regras de direito público, de modo que o art. 173 não deve ser lido isoladamente, mas sistematicamente. Basta constatar que a norma constitucional que obriga a adoção de processo licitatório para a contratação de compras, serviços, obras e alienações (art. 37, XXI, CF) não faz distinção acerca de seus destinatários (se de personalidade jurídica de direito público ou privado do Estado). É prudente, aqui, uma observação incidental: decerto que o art. 22, XXVII, CF, faz distinção para a criação de normas licitatórias para essas entidades, porém não as excluem do regime de direito público, o que pode ser confirmado pelo art. 173, § 1º, III, CF.
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Do mesmo modo, podem-se citar exemplos de aplicabilidade do regime de direito público sobre essas entidades nos artigos 37, II, (exigência de concurso público) e art. 37, §9º (submissão ao teto remuneratório), da mesma Constituição Federal.
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Tendo em conta essas premissas, pode-se concluir que:
a) As atividades estritamente de direito privado – e tão somente estas – das entidades mencionadas no art. 173 (e também aquelas cujo regime é semelhante, como as fundações públicas de direito privado) não se submeterão à publicidade eletrônica disposta pela nova LC 131/09. Ex.: O Banco do Brasil S.A. não necessitará disponibilizar as receitas decorrentes dos serviços bancários que presta.
b) Entretanto, as atividades de direito público dessas entidades – normalmente as atividades-meio – deverão submeter-se à publicidade eletrônica da LC 131/09, mesmo não se tratando de gastos cuja fonte de receita que lhe dá amparo não seja a orçamentária propriamente dita. Ex.: os gastos nas compras de materiais e equipamentos necessários ao desenvolvimento de suas atividades.
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Deixemos para posterior discussão a questão das concessionárias e daquelas empresas públicas ou sociedades de economia mista que recebem subvenções econômicas dos respectivos entes federados ou prestam serviços públicos.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O dever da Administração Pública de adotar os instrumentos informáticos

O artigo com este título foi publicado nos Anais do 38º Simposio Argentino de Informática y Derecho (SID 2009 - Mar del Plata), cujas conclusões do trabalho que foram aprovadas pelos seus curadores foram as seguintes:

"A título de conclusão, pode-se afirmar que a informática é, hoje, um dos instrumentos fundamentais para viabilizar a melhor transparência das atividades estatais, o exercício da democracia participativa no poder público e a concretização da eficiência administrativa. A transparência se cumpre fundamentalmente utilizando os sítios eletrônicos para a divulgação da atividade do Estado. O exercício democrático se faz com a utilização da convocação eletrônica dos cidadãos a participar de decisões políticas importantes. Do mesmo modo, as audiências telepresenciais, ouvidorias em portais oficiais, os “blogs” podem ter importante função de tornar mais efetivas e legítimas as atuações administrativas. E a eficiência se obtém tornando mais céleres, seguras, organizadas e econômicas as atividades estatais que forem objeto de informatização.
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Entretanto, o emprego da informática deve ser pautado na razoabilidade, de modo a compreendê-la e adotá-la a partir de seu valor fundamental que é o instrumental, voltado para emancipar a cidadania. A informática é meio para se atingir fins e não um fim em si mesmo.
A Constituição Federal não tutela a informática como um valor a ser concretizado, mas a exige para que a Administração Pública eleja meios mais qualificados para se atingir os fins do Estado. É o que impõe o princípio da eficiência administrativa, cujo perfil jurídico aponta para a escolha de meios para se atingir os fins.
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Exatamente por essa característica que a adoção dos instrumentos informáticos deve ser feita com cautela, com razoabilidade, pois adotada de modo inconsequente poderá acarretar prejuízo e o não atingimento daqueles fins que o Estado deve perseguir. Assim, deverá haver, previamente, para a informatização administrativa, a existência de pressupostos matérias, técnicos, econômicos e jurídicos. Por isso, não seria razoável implementar o processo administrativo eletrônico se a Administração ainda não está dotada de equipamentos suficientes ou de pessoal treinado para colocá-lo em pratica de modo seguro e satisfatório.
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Mesmo existindo tais pressupostos, a decisão de informatizar, bem assim os seus posteriores atos concretos, devem estar atentos para direta ou indiretamente não importar na configuração de discriminação injusta, de desemprego, de desperdício de recursos públicos e outras agressões a valores constitucionais fundamentais. É o que acontece quando se estabelece o sítio eletrônico como a única via de acesso a determinados serviços administrativos sem a implantação simultânea de infraestrutura de equipamentos e também de apoio logístico voltado a amparar o excluído digital. Tratar-se-ia aqui de discriminação injusta, não tolerada pela Carta da República.
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Por fim, registre-se que, atento a todos os limites e condicionamentos mencionados, e presente as condições materiais, técnicas, econômicas e jurídicas, a adoção da informática na Administração Pública revela-se como um ato vinculado (e não discricionário) por força do princípio constitucional da eficiência. Desse modo, não há liberdade para que a Administração Pública permaneça utilizando o sistema papelizado que é mais caro, menos transparente e menos eficiente"
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O referido trabalho (veja o texto integral aqui) foi fruto de novas reflexões e ponderações sobre um outro texto já publicado sobre a escolha dos instrumentos informáticos pela Administração como dever de ordem vinculada.
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A referência bibliográfica do trabalho é a seguinte:
FILGUEIRAS JÚNIOR, M. V. . O dever da Administração Pública Brasileira de adotar os instrumentos informáticos. In: Simposio Argentino de Informática y Derecho (SID 2009), 2009, Mar del Plata (Arg). Anales 38º JAIIO - Simposio Argentino de Informática y Derecho (SID 2009) ISSN 1850-2776. Buenos Aires : SADIO, 2009. v. 1. p. 47-61.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

LC 131/09: qual o valor jurídico dos dados disponibilizados nos sítio eletrônicos oficiais?

1. A questão é apenas aparentemente simplória. Poder-se-ia dizer que os dados divulgados eletronicamente constituem mera reprodução (cópia) de atos papelizados que se encontram autuados e registrados fora do ambiente digital com a finalidade exclusiva de auxiliar na transparência da atividade administrativa. Assim, não seriam, em si mesmos, dotados de valor jurídico, de modo que deles não podem advir efeitos.
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2. Entretanto, uma ponderação se faz necessária. A publicação oficial do ato também é uma reprodução papelizada (ou eletrônica, para aqueles entes detentores de diário oficial eletrônico) de um ato papelizado que se encontra registrado e autuado. Quando a lei exige a publicação oficial, esta passa a ser condição de eficácia dos atos (Veja-se o exemplo do art. 26, da Lei 8.666/93). É certo que a publicidade não compõe a materialidade do ato, de modo que não se configura seu pressuposto de existência. Mas a ausência de publicação oficial compromete a sua validade por vício de formalização ou formalidade, de maneira que se pode afirmar que se configura como um pressuposto de validade do ato ou contrato.
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3. Diante dessa realidade, impõe-se uma conclusão: a publicação eletrônica exigida pela LC 131/09 é um pressuposto de validade formalístico do ato papelizado. Por isso, a não disponibilização dos dados relativos a qualquer ato administrativo ou contrato não apenas viola o princípio da publicidade sujeitando o agente responsável às sanções da Lei de responsabilidade fiscal e aquelas que esta lei remete; mas compromete a validade do ato ou contrato que não teve os seus dados disponibilizados no sítio eletrônico oficial.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

LC 131: tecnicamente, em que momento a publicação eletrônica deverá efetivar-se?

1. De modo a facilitar o entendimento, transcrevo os dispositivos da LC 131/09:
Art. 1º O art. 48 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar com a seguinte redação:
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“Art. 48. ...................................................................................
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante:
I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público;
III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A.” (NR)
Art. 2o A Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 48-A, 73-A, 73-B e 73-C:
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a:
I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;
II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.”
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2. Os dados comentados na postagem anterior devem ser disponibilizados EM TEMPO REAL (art. 48, p.u., II). Isso significa que no exato momento em que os atos de execução orçamentária e financeira forem sendo elaborados concretamente, devem ser veiculados no sítio eletrônico oficial do ente federado.
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Além disso, falar que as despesas serão disponibilizadas EM TEMPO REAL, implica que todos os atos que vierem a formar o procedimento voltado para a realização da despesa deverão ser disponibilizados, os preparatórios e os executórios. A nova Lei estabeleceu que a disponibilização em tempo real deverá acontecer NO DECORRER DA EXECUÇÃO DA DESPESA e também NO MOMENTO DA SUA REALIZAÇÃO (art. 48-A, I). Essas duas últimas expressões legais (“no decorrer...” e “no momento...”) não foram dispostas no texto legal como sinônimas, mas, a meu juízo, como sendo a tradução de fases de um mesmo procedimento, como já comentei anteriormente.
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3. Tendo em conta o exposto, decerto que os programas informáticos comumente utilizados para a contabilidade orçamentária e financeira não atenderão ao exigido pela nova Lei, porque não há previsão – salvo melhor juízo – de disponibilização de dados relativos a um contrato, no momento do seu firmamento, isto é, bem antes da sua execução e bem antes de ter gerado qualquer lançamento orçamentário ou financeiro. Tais programas deverão passar por adaptações para atender aos novos comandos da Lei de Responsabilidade Fiscal com a redação que lhe deu a LC 131/09.
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4. Decorre disso, que será mesmo inadiável, como já comentamos anteriormente em vários momentos neste blog, a instituição de uma disciplina jurídica do processo administrativo eletrônico. Na medida em que tal processo for instituído, a sua validade eletrônica, por si só, já atenderia por completo às exigências da Lei.

terça-feira, 9 de junho de 2009

LC 131/09: o que deverá ser disponibilizado ao cidadão pelo sítio eletrônico oficial

Introdução
Dando continuidade aos comentários anteriores sobre a Lei Complementar 131/09, que alterou dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00), procurarei responder o que deverá, pormenorizadamente, ser objeto de publicação eletrônica no sítio oficial das Administrações Públicas.

O art. 48, II, da LC 101 (com redação dada pela LC 131/09) exige a disponibilização “de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira” e no art. 48-A, I e II, do mesmo estatuto, regulamenta o que venha a ser essas “informações pormenorizadas” subdividindo-as em informações relativas às despesas e às receitas.

Informações das despesas
Quanto às despesas (art. 48-A, I), a Lei estabelece que deverão ser publicados no sítio eletrônico da Administração Pública correspondente os atos jurídicos que realizam efetivamente as despesas referentes ao orçamento e às finanças e também aqueles preparatórios para tanto. É o que se pode extrair da dicção do referido inciso I, do art. 48-A, que fixa que “todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização (...)”.

Creio que numa interpretação teleológica do dispositivo verifica-se que as expressões “no decorrer da execução” e “no momento da execução” foram colocadas para reforçar que não se trata apenas da disponibilização da informação do momento final da realização da despesa, tal como se faz no relatório de gestão fiscal, mas as informações também de todo o seu ciclo de formação, ou seja, do seu iter.

Portanto, não basta disponibilizar para “pleno conhecimento” os lançamentos financeiros ou os orçamentários com as respectivas informações resumidas, mas também as informações sobre os atos jurídicos que deram origem à despesa, de modo que deverão ser disponibilizadas as referências dos atos administrativos e também dos contratos administrativos ou assemelhados (convênios, consórcios, termos de parceria, contratos de gestão etc.) ensejadores das despesas. E mais: a lei acrescenta que deverão tais informações conter, no mínimo, o seguinte: o número do processo administrativo relativo à despesa, o bem fornecido ou o serviço prestado, o beneficiário da despesa e o número do procedimento licitatório, se for o caso. Assim, desnecessário destacar que deverá constar o nome ou razão social do beneficiário, com o respectivo CPF ou CNPJ.

Registro, ainda, mais dois aspectos: a) é comum o processo de licitação constar um processo administrativo e o pagamento constar de outro. Neste caso, deverão ser informados os dois, de modo a permitir o adequado controle da despesa. b) quando a lei exige a disponibilização de “no mínimo” tais e quais informações, deve ser interpretado que, conforme o caso, haverá a necessidade de ser disponibilizada mais informações para uma adequada compreensão do teor da despesa. Um pequeno exemplo: informações sobre determinado gasto feito com base em contrato: deverão estar presentes todas as informações acima (valor, nº do processo, bem fornecido, favorecido etc), além de informar a classificação da despesa (natureza da despesa com o seu respectivo subelemento) e o programa de trabalho ao qual está vinculado, de maneira a permitir o controle a execução orçamentária e também financeira.

Informações das receitas
No que toca aos créditos, a Lei (art. 48-A, II) exige a disponibilização do “lançamento e o recebimento de toda receita”. De pronto constata-se que qualquer ingresso de recursos nos cofres públicos deverá ser objeto de disponibilização eletrônica, mesmo que se caracterize ingresso provisório e, por isso, não venha a classificar-se como receita pública.

De outro lado, não é só a informação do “lançamento” contábil que deve ser disponibilizado, mas também a do “recebimento” do recurso. A importância deste aspecto se apresenta quando se está diante de receitas originárias, que podem ser patrimoniais ou empresariais. Por exemplo, a prestação de um serviço pela Administração Pública ensejará o pagamento pelo tomador que será depositado na conta do tesouro (receita empresarial). Deverá ser publicada a informação tanto do depósito na conta como também do posterior lançamento contábil correspondente ao depósito. As razões para essa exigência parecem mesmo óbvias, dado o alto nível de descontrole da Administração Pública.

As informações das “unidades gestoras”
A Lei estabelece que as informações a serem disponibilizadas serão das “unidades gestoras”. No segundo comentário sobre a Lei (aqui), coloquei em questão o conceito jurídico de “unidade gestora”, o que procurarei agora enfrentar.


“Unidade orçamentária” é um núcleo de poder da Administração Pública, dotado de competências, para a qual a Lei orçamentária atribui dotação própria e lhe confere responsabilidade na execução orçamentária. Por dotação deve ser entendido aquele montante de recursos atribuído a tal núcleo de poder. Esse conceito de unidade orçamentária pode ser extraído do art. 14, da Lei 4.320/64.

“Unidade administrativa” é qualquer núcleo de poder da Administração Pública, dotado de competências, que forma um órgão ou entidade da Administração Pública. Uma unidade orçamentária é necessariamente uma unidade administrativa, mas nem sempre o contrário é necessariamente verdadeiro. Aliás, excepcionalmente poderá acontecer que um órgão público receba mais de uma dotação orçamentária a ser destinada a unidades administrativas diferentes que o conformam, tal como autoriza o art. 14, parágrafo único, da Lei 4.320/64.

Já “unidade gestora” é aquela unidade administrativa que detém competência para praticar atos de gestão, o que significa dizer que são unidades administrativas autorizadas a gerir recursos orçamentários e financeiros. Portanto, trata-se de núcleo de poder cujos atos decisórios que importem em gastos serão julgados pela Corte de Contas.
Decorre desses conceitos que a LC 131 exige que se disponibilize as informações referidas nos tópicos anteriores de todos os núcleos de poder da Administração Pública que detém capacidade jurídica para realizar atos de despesa. Alerte-se para o fato de poderá haver unidade orçamentária que possui mais de uma unidade gestora. Exemplo: uma Secretaria de Educação (órgão) é uma unidade orçamentária, mas duas de suas unidades administrativas formadoras (ex.: Departamento de Ensino à distância e Departamento de Ensino Básico) detém poderes para executar determinados atos de despesas (assinar convênio, realizar compras etc).

segunda-feira, 1 de junho de 2009

LC 131: quem terá a responsabilidade de disponibilizar eletronicamente as informações?

1. Acerca da nova Lei Complementar n. 131, de 27.05.2009, comentada em 28 de maio/09 (veja aqui), quatro perguntas se apresentam como importantes e urgentes:
a) Quem terá a obrigação de disponibilizar as informações eletronicamente.
b) O que precisamente deverá ser disponibilizado.
c) Qual o momento em que essa disponibilização deverá, tecnicamente, acontecer.
d) Como e através de que instrumentos deverão ser as informações disponibilizadas.

2. Comecemos pela primeira indagação que é relevante especialmente pelo fato de haver uma Administração Pública direta para cada poder e também pela existência da Administração Pública indireta, que é formada pelas pessoas jurídicas do Estado (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, consórcios públicos) detentoras de autonomia, patrimônio próprio e que não se confundem com os entes federados (União, Estados-membros, municípios e Distrito Federal) que as criaram. Note-se que as entidades da Administração Pública indireta são apenas vinculadas às suas respectivas Administrações diretas, mas não subordinadas.

3. A Lei determina que os “entes da federação” disponibilizarão as informações de suas “unidades gestoras” (art.48-A, LC 131/09). É certo que a questão não pode ser simplificada, porque o conceito de “unidade gestora” nem sempre coincidirá com o de “unidade orçamentária” e nem mesmo com o de “unidade administrativa” no âmbito do direito administrativo-financeiro, o que apresenta importantes consequências práticas. Deixemos para outra oportunidade o detalhamento técnico deste aspecto e os exemplos práticos correspondentes.

4. Não obstante, para o momento, pode-se sintetizar o seguinte:
a) O Chefe do Poder Executivo terá o dever de disponibilizar diversas informações relativamente aos órgãos da Administração Pública direta, das entidades da Administração indireta e, em algumas situações, se responsabilizará também pela disponibilização de informações relativas às Administrações Públicas dos Poderes Legislativo e Judiciário, por conta da unidade orçamentária, como no caso do relatório resumido de execução orçamentária (art. 165, §3º, CF e art. 52, da Lei de Responsabilidade Fiscal). Por essa razão a Lei exigiu que seja adotado sistema informático “integrado” (art. 48, III, LC 131/09). O referido dispositivo acrescenta que o tal sistema deverá atender aos padrões de qualidade a serem fixados pelo Poder Executivo da União (o que é de duvidosa constitucionalidade) e ao previsto pelo art. 48-A (nesta última exigência não há o que questionar).

b) Os chefes das Administrações Públicas dos Poderes Legislativo (presidente de Casa Legislativa) e Judiciário (presidente de Tribunal) deverão disponibilizar informações de seus órgãos formadores que se caracterizarem como unidades gestoras, e de suas entidades da Administração Pública indireta, se houver. Por certo que serão aquelas informações que não forem objeto de disponibilização por parte da chefia do Executivo.

c) Caberá aos dirigentes das Administrações Públicas indiretas a responsabilidade de prestar adequadamente as informações ao Chefe do Executivo (ou outro Chefe, conforme o caso) especialmente pela utilização do dito sistema integrado.

5. Quanto às demais perguntas (o que, quando e como), ficarão para outras oportunidades, em breve.