quinta-feira, 28 de maio de 2009

Primeiras impressões sobre a Lei Complementar 131, de 27.05.2009, a chamada Lei da transparência

A LEI COMPLEMENTAR 131/09

1. A LC 131/09 acrescentou dispositivos à Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00). É bom que se diga que a LRF já determinava que os “instrumentos de transparência de gestão fiscal“ fossem divulgados inclusive por meio de acesso público eletrônico, leia-se, internet (art. 48, cabeça). Os tais instrumentos são: leis orçamentárias, relatório de gestão fiscal, relatório resumido de execução a orçamentária. Os prazos dificilmente são cumpridos. Neste mesmo espaço já se comentou sobre essa questão (Relembre aqui).

2. Agora, ao parágrafo único do referido artigo foram acrescentados mais dois comandos jurídicos:
a) O dever de disponibilizar por meio eletrônico de acesso público e “em tempo real”, “as informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira” (art. 48, II).
b) O dever de adotar um sistema informático de administração financeira e controle que atenda aos padrões de qualidade estabelecidos pelo Poder Executivo da União e pelo previsto no art. 48-A (dispositivo também acrescentado pela LC 131/09).
Esse artigo 48-A assim dispõe:
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a:
I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;
II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários."

PRIMEIRAS OBSERVAÇÕES E IMPRESSÕES

1. Não bastará disponibilizar as informações genéricas contidas nos relatórios de transparência fiscal, porque isso a LRF já exigia (e nem sempre cumprida). As informações acessíveis eletronicamente deverão ser mais detalhadas ou, nas palavras do texto legal, “pormenorizadas”.

2. Disponibilizar “em tempo real” tais dados pormenorizados significará que, sendo realizados os atos administrativos (ou contratos e outros atos de gestão), lançamentos orçamentários e financeiros, instantaneamente os dados a eles correspondentes deverão estar acessíveis eletronicamente já com a formação do processo administrativo devidamente numerado e registrado.

3. Decorre disso que parece mesmo urgente a necessidade da constituição do processo administrativo eletrônico, de modo a não tornar inviável a Administração Pública manter dois sistemas paralelos em funcionamento: o papelizado e o digital.

4. De uma maneira geral, a primeira impressão que fica é positiva. Parece um grande avanço. Registre-se que, segundo a nova Lei, Campos terá apenas um ano para cumprir essas novas regras (art. 73-B, LC 101/00), porque possui mais de cem mil habitantes.
obs.: republicado em razão de correções

8 comentários:

Anônimo disse...

Caro Prof. Marcus, conforme você vem coerentemente anunciando em suas palestras sobre esse instigante tema, a Administração Digital se tornará uma realidade em muito pouco tempo e os Administradores Públicos têm que se adaptar a essa nova e bem vinda realidade. Parabéns pelos seus visionários estudos sobre o tema!

RODRIGO KLEM.

Unknown disse...

Oi Marcus,
Quando você chama a atenção nas suas primeiras impressões dessa nova lei para a expressão “em tempo real” denuncia também uma questão clássica no meio jurídico: o sistema de acesso de forma geral ao direito. Essa lei então direta e indiretamente favorece essa promoção... não?
Grande abraço!
Cyntia Jorge

Marcus Filgueiras disse...

Cyntia,
Concordo. O acesso à justiça, às atividades da Administração Pública e às coisas do direito em geral são sempre difíceis, distantes mesmo do cidadão. Essa Lei, creio, poderá aproximar o cidadão do Estado, na medida em que permitirá melhor conhecê-lo, na sua intimidade. Por isso, acredito que a expressão que você usou seja bastante própria: promoção. Não tenho dúvidas de que, se cumprida, a Lei será uma importante forma de promoção cidadã.

Mas há muito trabalho pela frente. Precisaremos todos refletir sobre os seus contornos, os seus limites e como implementá-la. Em breve começaremos a trazer questões mais concretas que envolvem o tema.

Anônimo disse...

Prof Marcus,

Tenho uma dúvida, pode uma lei municipal posterior a essa lei federal, estabelecer prazo inferior para disponibilização das informações na internet, em forma de portal da transparência?

Marcus Filgueiras disse...

Prezado Anônimo,

A questão é interessante. Em minha opinião é possível sim uma lei municipal estabelecer prazo MENOR do que aqueles previstos pelo art. 73-B, da LC 101/00 (inserido pela LC 131/09), por conta da autonomia administrativa dos entes da federação (art. 18, da CF).

Sei que a questão merece análise da constitucionalidade do dispositivo. E não há como fazê-lo a contento neste espaço.

Em princípio, creio que a norma em questão é de direito administrativo, uma vez que disciplina a publicidade de atos da Administração Pública. Vejo que não se trata de normas gerais relativas à licitação e contratação administrativa. Assim, não impediria a fixação até mesmo de prazo superior, para o que a referida norma deveria ser reputada inconstitucional por ferir a autonomia dos entes da federação.

De outro lado, é certo que o direito financeiro vem passando por uma reformulação digna de nota, especialmente após o advento da LRF. Por isso, há quem já considere que a publicação comum e eletrônica da atividade financeira do Estado é matéria atinente ao controle financeiro e, portanto, inserida no âmbito do direito financeiro (não tenho ainda essa convicção). Neste caso, o município não poderia fixar prazo maior ao estabelecido pelo art. 73-B, porque estaria a norma caracterizada como "norma geral" (vide art. 24, I e § 1º, CF).

De todo modo, não sugeriria a fixação de prazo maior ou mesmo menor.

Lú Maria disse...

Prezado, boa tarde,
Comentando sobre o questionamento de Antonio sobre a possibilidade de uma lei municipal estabelecer prazo inferior ao da lei federal, tive uma dúvida cruel. Pode um município fazer uma lei que obrigasse ao Município a observância da LC 131/09? Exemplo: uma lei municipal que obrigue o Municício X a observar a lei 131 relativamente ao portal da transparência. Entendo desnecessário a edição de uma lei municipal obrigando a observância de uma lei federal. Pode isso acontecer?

Lú Maria

Marcus Filgueiras disse...

Preza Lu Maria,

A LC 131/09 já é de observância obrigatória por parte dos Municípios. Portanto, desnecessária é a promulgação de lei municipal nesse sentido. Relembre-se que a referida LC alterou a LC 101/00, que é a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, a qual deve ser cumprida por todos os entes da federação.

Maurício disse...

Caro professor, o poder legislativo municipal (câmaras) seriam obrigados a cumprir esta lei?
Sei que cabe ao poder público dar publicidade a seus atos, e até seria importante que as Câmaras municipais adotassem o que dispõe a lei.
Mais existe uma grande distancia entre querer e poder, os municípios creio eu, terão certa dificuldade técnica no início para se enquadrar, deverão ter que normatizar seus processos internos e com isso mudar a forma com que trabalham hoje.
Sei que é até possível, e deve a União se preocupar em auxiliar todos os outros entes hierarquicamente falando.
Mais em se tratando de câmara municipais, a lei não é clara, e por isso a minha pergunta, visto que se os municípios terão dificuldades, quanto mais as Câmaras municipais de Vereadores.
Fico no aguardo de sua resposta, grato desde já.

Att,
Maurício