Um amigo da
área jurídica – que parece não querer ser identificado – me escreveu para fazer
um comentário sobre a postagem anterior deste espaço.
Com
elegância e respeito, ele sugeriu a atualização da postagem. Fez referência a outro
texto do blog do Juca Kfouri (aqui) – posterior ao que citei – em que o jornalista, valendo-se do artigo do advogado Carlos Embiel, mudou de
opinião por causa do Estatuto do Torcedor, que é uma lei federal e que prevalece
frente ao Regulamento da CBF.
Só para
lembrar, o referido estatuto determina que as decisões da Justiça Desportiva
devem ser publicadas em seu boletim oficial. O Regulamento da CBF não
estabelece essa forma de intimação das decisões.
No caso da
Portuguesa e Flamengo, as decisões que condenavam os atletas não foram publicadas
como determina a Lei. Logo, em princípio, os jogadores utilizados na partida
não estariam, formalmente, irregulares.
Caro amigo,
não creio que a postagem anterior careça de atualização.
A nova argumentação
que envolve o Estatuto do Torcedor não contradiz o que afirmei, ou seja, não
creio que seja injusto aplicar a sanção a quem utiliza jogador irregularmente.
O Direito impõe condições para a prática desportiva. O espírito esportivo
também o exige.
A dedução
que decorre dessa racionalidade é simples: se o jogador não estava impedido de
ser inscrito para a partida, não há que se falar na aplicação de sanção por
utilizá-lo.
Mas o que continua
a chamar a minha atenção é mesmo a essência da postagem anterior: a coerência. Explico-me.
Logo quando
surgiu o fato, li argumentos no sentido de que não seria justo retirar os
pontos da Portuguesa e do Flamengo porque deveria pesar mais o resultado em
campo que eventuais formalidades jurídicas.
E aí se
instaurou, nesse primeiro momento, o debate sobre o que seria moral e o legal.
Choveram
argumentos para sustentar que deveria prevalecer o resultado do jogo obtido
dentro das quatro linhas, porque esse era o espírito desportivo. Houve também
apelo ao bom senso e ao sentimento de justiça que devem preponderar sobre quaisquer
formalidades.
No entanto,
com a sobrevinda da tese do Estatuto do Torcedor, passou-se a defender a
Portuguesa e o Flamengo com base no argumento da legalidade e da técnica jurídica:
a lei é superior ao Regulamento da CBF, houve descumprimento de uma formalidade
básica e elementar do Direito, deve ser restabelecido o Estado de Direito, entre
outros.
Enfim, para
alcançar o mesmo resultado final, muitos dos que condenavam as formalidades passaram,
de certo modo, a defendê-las.
Aliás, no
primeiro momento, o próprio Juca criticou o atendimento puro e formal às normas
escritas.
No segundo
texto veiculado, entretanto, em que foi agregada a questão do Estatuto do Torcedor,
não pudemos ler o mesmo repúdio às formalidades. Afinal de contas, o modo de se
fazer uma publicação ou intimação é, necessariamente, um tema de formalidade
jurídica.
Ressalto
que Juca Kfouri é um excelente jornalista e teve a coragem de mudar de opinião de
forma transparente e honesta. Mas não posso deixar de anotar o aspecto que toca
à coerência entre seus dois textos.
Termino
recomendando a leitura do belo texto do jurista Lenio Streck sobre o tema, em
que aproveita para homenagear os locutores esportivos (aqui).
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