Prosseguimos
no debate. Transcrevo abaixo a nova manifestação do interlocutor anônimo e, em
seguida, faço minhas considerações.
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“Professor, os julgados apresentados pelo
senhor foram anteriores ao julgamento da ADI 448/PR e não afastam as conclusões
a que cheguei. E não, o sistema federal não vai ser julgado inconstitucional
pois, como eu disse, as normas são diversas. Sei que o senhor as conhece, mas
leia outra vez:
"Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, DIRETAMENTE OU ATRAVÉS DE ÓRGÃO VINCULADO, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo."
"Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas"
"Art. 69. Será permitido aos Estados manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções."
Veja que as normas são notadamente DIVERSAS.
Além do mais, felizmente e para o bem dos serviços jurídicos dos Estados e do DF, não fui o único a ler o julgamento da ADI 448 e dos dispositivos supracitados da forma como expus no primeiro comentário.
Tanto a AGU, quanto o PGR confrotaram as normas constitucionais e expuseram com clareza a diferença entre os sistemas da União e dos Estados e DF.
Apenas para apontar uma questão de ordem prática, peço que pense sobre uma questão: para onde iriam os advogados dessas novas carreiras após uma reforma administrativa que decidisse pela centralização dos serviços públicos, decidindo pela extinção das entidades da Administração Indireta? Seriam postos em disponibilidade? Continuariam recebendo sem trabalho a par da escassez de recursos anunciada aos quatro cantos?
Sem dispensar sua resposta, já ajudo. O constituinte originário não fez norma para ser aplicada em outro país, pelo contrário. Fez conhecedor das realidades adminsitrativas e política dos Estados que, o senhor há de convir, são bem diferentes da realidade da União. Daí, entre outros e variados motivos tão importantes ou mais, a necessidade de previsão de órgão único.
Por fim, agradeço pela deferência, e desde já peço desculpa aos possíveis beneficiários da PEC, mas a Administração tem que pautar-se pelo interesse público e não por interesse de um público que fez um concurso simplificado e com grau de remuneração muito inferior, em ingressar numa carreira sem ter observado os requisitos constitucionais para tanto”.
"Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, DIRETAMENTE OU ATRAVÉS DE ÓRGÃO VINCULADO, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo."
"Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas"
"Art. 69. Será permitido aos Estados manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções."
Veja que as normas são notadamente DIVERSAS.
Além do mais, felizmente e para o bem dos serviços jurídicos dos Estados e do DF, não fui o único a ler o julgamento da ADI 448 e dos dispositivos supracitados da forma como expus no primeiro comentário.
Tanto a AGU, quanto o PGR confrotaram as normas constitucionais e expuseram com clareza a diferença entre os sistemas da União e dos Estados e DF.
Apenas para apontar uma questão de ordem prática, peço que pense sobre uma questão: para onde iriam os advogados dessas novas carreiras após uma reforma administrativa que decidisse pela centralização dos serviços públicos, decidindo pela extinção das entidades da Administração Indireta? Seriam postos em disponibilidade? Continuariam recebendo sem trabalho a par da escassez de recursos anunciada aos quatro cantos?
Sem dispensar sua resposta, já ajudo. O constituinte originário não fez norma para ser aplicada em outro país, pelo contrário. Fez conhecedor das realidades adminsitrativas e política dos Estados que, o senhor há de convir, são bem diferentes da realidade da União. Daí, entre outros e variados motivos tão importantes ou mais, a necessidade de previsão de órgão único.
Por fim, agradeço pela deferência, e desde já peço desculpa aos possíveis beneficiários da PEC, mas a Administração tem que pautar-se pelo interesse público e não por interesse de um público que fez um concurso simplificado e com grau de remuneração muito inferior, em ingressar numa carreira sem ter observado os requisitos constitucionais para tanto”.
Caro
interlocutor anônimo,
A ADI 484/PR
é, de fato, posterior à ADI 175. Em momento algum tentei dizer algo diverso.
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Mas é
oportuno destacar que a manifestação do STF na ADI 484, citada pelo colega, não
se configura como uma alteração da posição adotada na ADI 175. E nem poderia
fazê-lo pela evidente razão de que ambas as ações se reportam a análises do
art. 132 para finalidades distintas entre si e debaixo de contextos também
distintos, como já havíamos destacado.
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De qualquer
forma, há outras manifestações na jurisprudência que convergem para a tese que
defendemos, como fizemos menção em outro momento.
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Por isso, insisto
no perigo do decisionismo jurídico anticientífico que pretende extrair conclusões
gerais de textos particulares veiculados em contextos diferentes um do outro. Assim,
reafirmamos que o tema da representação judicial das Administrações Indiretas
dos Estados ainda não foi tratado em sua integralidade pelo STF.
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Para
reafirmar que o tratamento constitucional das advocacias públicas da União e do
Estado é totalmente distinta, o colega anônimo ampara-se, uma vez mais, na
interpretação literal dos artigos art. 131 e art. 132 da Constituição Federal.
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A
interpretação literal é extremamente limitada para ser capaz de definir
diferenças deste porte. Há a diferença de texto, não necessariamente de norma. Não
se pode perder de vista que o texto não se confunde com a norma.
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Mas, ainda assim,
ao aplicar a interpretação literal ao texto integral do art. 131 – e não só a
parte que o interlocutor colocou em caixa alta – verifica-se que a representação
judicial e extrajudicial feita pela AGU, e seus órgãos vinculados ou não, é da “União”.
A figura jurídica da representação destina-se à pessoa jurídica. Ora, literalmente,
a União é uma pessoa jurídica que não se confunde com as pessoas da
Administração Indireta. Ao se cumprir a interpretação literal resultaria na
imposição de que a União abrigasse órgãos jurídicos dotados de autonomia dentro
da própria Administração Direta (o que, aliás, era uma situação conhecida na
esfera federal antes da organização da AGU).
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O fato é que
tal interpretação não seria razoável, se apreciada na perspectiva sistemática
da Carta da República. O princípio da descentralização impõe algumas condições,
como já comentamos em outra oportunidade.
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Por isso, acertadamente,
a LC 73/93 tratou de mencionar que as autarquias e fundações federais seriam
representadas pelos seus órgãos próprios (art. 17). Com isso, afastou eventuais
dúvidas decorrentes da literalidade da Constituição.
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De outro
lado, a expressão “unidades federadas” contida no art. 132 não pode reportar-se
às pessoas jurídicas vinculadas à pessoa jurídica que responde pela própria Unidade
Federada. As pessoas vinculadas da Administração Indireta não representam a
Unidade Federada e não podem falar em nome dela em juízo ou fora dele. As
pessoas jurídicas da Administração Indireta são apenas criadas pelo ente
federado e a ele se vinculam. O criador não se confunde com a criatura.
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Ademais, o
Constituinte não usou a expressão “unidades federadas” contida art. 132 em
nenhum outro lugar para fazer crer que a sua interpretação literal representa o
conjunto de todas as pessoas jurídicas de direito público instituídas dentro do
Estado. Muito ao contrário, quando se pretende alcançar a Administração
Indireta, a Constituição fez menção expressa a elas em diversos pontos.
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Por tudo
isso, nem mesmo literalmente tenho condições de me alinhar ao interlocutor
anônimo.
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Mas
independente do raciocínio exposto, podemos fazer, a seguir, um exercício de
imaginação.
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Partamos,
então, da premissa de que o tratamento Constitucional do Estado e da União é
distinto, tal qual defende o colega anônimo.
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Pois bem. Inspirando-se
no exitoso sistema de advocacia pública federal, o Constituinte derivado resolve
“alterar” o sistema estadual na Constituição. Qual seria o impedimento para
tanto? Violaria a autonomia administrativa estadual? Por que razão? O Constituinte
deu este tratamento para a União sem configurar violação alguma. E relembre-se
que o constituinte – mesmo o derivado – não se confunde com o legislador
federal que exerce a autonomia legislativa da União. Se houve tratamento assim
para a União, poderá ser o mesmo feito para o Estado, por simetria.
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Também por
essas razões, respeitosamente, não podemos comungar do mesmo entendimento do
anônimo.
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O
interlocutor também propõe uma questão de ordem prática. Pergunta se, com a “criação
da nova carreira”, como ficaria se a administração indireta, a qual pertencesse
agentes dessa carreira, viesse a ser extinta?
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Inicialmente,
há que se reconhecer que não são todos os dias que vemos a extinção de
autarquias e fundações. Trata-se de uma excepcionalidade. Mas se o interlocutor
crê que a exceção deve condicionar a regra. Embarquemos no seu exercício imaginativo.
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Comecemos
por advertir que não se trata propriamente de “novas carreiras”. Os advogados públicos
já existem na Administração Indireta. Apenas passariam, na prática, a exercer a
representação judicial das respectivas entidades.
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A resposta à
indagação formulada pelo anônimo vem prevista pela própria Constituição. Com a
extinção da entidade (e consequente extinção do cargo), o servidor ficará em
disponibilidade, com remuneração proporcional, até o seu aproveitamento em
outro cargo (art. 41, § 3º). Em outras palavras, o advogado público terá o
mesmo destino dos demais servidores do ente extinto. Neste ponto, não creio ser
possível sustentar que a escassez de recursos tenha força para extinguir ou
restringir o direito à disponibilidade de estatura constitucional.
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É bom
lembrar que a PEC 80 não faz a unificação da carreira de procuradores de Estado
com a dos procuradores autárquicos e fundacionais. Esse tema poderá até ser tratado
no âmbito de cada Estado, tal como a LC 73/93 fez com a AGU no âmbito da União.
Havendo um tratamento Estadual que unifique, a resposta poderá ser outra. Mas é
importante considerar que a PEC 80 não tem esse alcance.
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No penúltimo
parágrafo, o interlocutor anônimo aduz que o Constituinte originário deu
tratamento diferente entre a União e os Estados por entender que são realidades
distintas. E, por isso, previu a necessidade de um órgão jurídico de único para
os Estados.
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É verdade
que há diferenças importantes entre a União e os Estados. É um argumento
sociológico que procede. No entanto, se observado os contornos do ponto de
vista jurídico, a questão se altera. A Administração Pública em todos os entes
federados é estruturada da mesma forma jurídica. As Administrações Públicas
Indiretas são vinculadas e não subordinadas às Diretas em todos eles.
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As pessoas
jurídicas que compõem a Administração Indireta se traduzem em ponto de imputação
de direitos e obrigações distintos da Administração Direta. Por isso, a
descentralização impõe um regime jurídico que exige a conservação da autonomia.
Aliás, vários diplomas normativos reconhecem inclusive a possibilidade de
conflitos entre tais pessoas. Cito o recente exemplo da Lei de Mediação (Lei 13.140/2015.
Art. 32. A União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios poderão criar câmaras de prevenção e resolução administrativa
de conflitos, no âmbito dos respectivos órgãos da Advocacia Pública, onde
houver, com competência para: I - dirimir conflitos entre órgãos e entidades da
administração pública;).
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O
interlocutor termina sua manifestação agradecendo a deferência e declarando o
seguinte: “desde já peço desculpa aos
possíveis beneficiários da PEC, mas a Administração tem que pautar-se pelo
interesse público e não por interesse de um público que fez um concurso
simplificado e com grau de remuneração muito inferior, em ingressar numa
carreira sem ter observado os requisitos constitucionais para tanto”.
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Perdoe-me,
mas afirmar que a PEC 80 “não pauta pelo interesse público” é um tipo de
argumento que nada diz. A verdade é que não passa de mera fraseologia, como
dizia o administrativista argentino Rafael Bielsa, na media em que não se
concretiza com referência aos motivos reais.
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Do mesmo
modo, afirmar que a PEC, em vez do interesse público, pauta pelo interesse de
um público que “fez um concurso
simplificado e com grau muito inferior de remuneração” tampouco me parece
convincente, pois a PEC não aumenta vencimentos, não cria cargos novos e muito
menos promove a equiparação dos advogados públicos aos procuradores para
efeitos remuneratórios.
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É importante
destacar também que os destinatários da PEC em questão não fizeram “concurso
simplificado” porque não existe esta modalidade de certame público para acesso
aos cargos públicos. Há o “concurso público”. Ao que temos notícia, todos os
advogados públicos das autarquias e fundações, após a Constituição vigente, foram
submetidos aos concursos de provas ou provas e títulos. Portanto, creio que se
mostra inverídica a manifestação do colega.
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No entanto,
se (e tão-somente se) a menção a “concurso simplificado” teve a finalidade
depreciativa ou de menosprezo, é de se lamentar. O argumento escaparia da área
jurídica e, assim, fugiria do escopo da discussão. A resposta mais recomendada para
os casos da espécie é mesmo o silêncio.
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Nessa perspectiva,
confesso que sofro a tentação de discutir sobre os concursos públicos, sobre o
que significa, de fato, “concursos mais exigentes” ou “menos exigentes”, sobre
a presunção do saber jurídico, sobre o que significa realmente o conhecimento
jurídico e também como se manifesta, na realidade, o preparo profissional para eficiente
defesa do Estado.
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Mas não
cederei à tentação por ser impertinente à juridicidade do caso, e que apenas pode
contribuir para mais desagregação. É vital não perdermos o foco da discussão
democrática, cordial e que busque os melhores caminhos para a advocacia pública
como um todo, inclusive para as próprias Procuradorias Gerais.
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Por fim, quanto
à frase final do interlocutor, ela não pode ser aceita. Acusa os advogados
públicos da Administração Indireta de terem feito concurso cientes de que
estavam descumprindo à Constituição (por ser, supostamente, único o órgão
jurídico Estadual). A acusação é infeliz, pois os que interpretam a tese da
unicidade de representação judicial pelas PGEs não são os donos da verdade absoluta. Não há unanimidade nem mesmo entre as Procuradorias Gerais de Estado e seus
procuradores.
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Cito o
exemplo do Estado do Rio de Janeiro e sua Procuradoria Geral do Estado - PGE, instituição
nacionalmente conhecida inclusive pelos excelentes quadros que gera, como o
Ilustre Ministro Luiz Roberto Barroso. A Lei Orgânica da PGE/RJ (LC 15/80 com
suas diversas atualizações) garante, com clareza e objetividade, que a PGE não
representa as pessoas jurídica da Administração Indireta e somente poderia
fazê-lo por meio de convênio. Estabelece, inclusive, acréscimo remuneratório
para os procuradores que, por intermédio do convênio, exercem tal atribuição na
Administração Indireta:
Art. 2º (...)
(...)
§ 3º - Mediante convênios ou contratos, a critério do Procurador-Geral
do Estado, poderá a Procuradoria Geral do Estado prestar consultoria jurídica e
encarregar-se de atos e providências judiciais do interesse dos Municípios do Estado
do Rio de Janeiro, podendo, também, por ato próprio do Procurador-Geral do
Estado ou por determinação do Governador do Estado, em cada caso, prestar tais
serviços a entidades da Administração Indireta do Estado ou fundações por ele
criadas ou mantidas, assegurados, em conseqüência, o reembolso de eventuais
despesas, acréscimos remuneratórios ou prêmios por produtividade aos
Procuradores que exerçam funções no âmbito da Procuradoria Geral do Estado ou
em cargo pertencente ao sistema jurídico do Estado do Rio de Janeiro. (Nova redação
dada pela Lei Complementar nº 111/2006)
§ 4º - Os acréscimos remuneratórios ou prêmios de produtividade, de que
trata o §3º deste artigo, corresponderão a valor equivalente ao percentual de
1%(um por cento) a 5% (cinco por cento) do valor total da remuneração de Procurador
do Estado de terceira categoria, a ser fixado por ato exclusivo do Procurador-Geral
do Estado, caso a caso, avaliados a complexidade e o volume das ações
judiciais. (Acrescentado pela Lei Complementar nº 111/2006).
.
Frente a todo o exposto, se
pode constatar que o debate, nestas condições e circunstâncias, já não tem
muito o que avançar com o interlocutor anônimo. Fico por aqui.
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