Há quem entenda
que a proteção universal dos direitos humanos é irreconciliável com a soberania.
Há estudos importantes nesse sentido. Cito o do Professor internacionalista
Valério Mazzuoli: “Soberania e a proteção internacional dos direitos humanos:
dois fundamentos irreconciliáveis” (aqui).
Em verdade –
é necessário que se esclareça –, Mazzuoli defende, no fundo, que seria
inaceitável que se justificasse a impossibilidade de garantir a proteção de um
direito humano sob o argumento de incompatibilidade com o direito interno. Acredito que, neste aspecto, tenha razão.
No caso do
sistema interamericano de direitos humanos, há quem não acredite na possibilidade
de uma sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos desconstituir um
acórdão do Poder Judiciário brasileiro por caracterizar violação à soberania
nacional.
Prefiro não
tratar o tema na lógica da “irreconciliabilidade” entre o direito interno e a proteção de direitos
humanos por parte de um tribunal internacional.
O fundamento específico para a execução de uma decisão da
Corte Iteramericana de Direitos Humanos - CIDH no Brasil está nas normas infraconstitucionais com amparo na Constituição Federal, tal
como comentamos na postagem anterior (aqui). Relembro que o Código de Processo
Penal, as normas complementares ao processo penal e o Regimento Interno do STF
não podem contrariar nenhum tratado, especialmente aqueles sobre direitos
humanos. Os tratados são considerados normas supralegais e
infraconstitucionais. Assim, todas as leis federais, estaduais e municipais
devem respeitá-los.
Cremos que há duas soluções quando uma norma
infraconstitucional apresenta incompatibilidade com um tratado: a) realizar uma
interpretação conforme o tratado, extensiva, restritiva, com ou sem redução de texto normativo; ou b) considerar a norma infraconstitucional
como revogada por incompatibilidade.
Na mesma
perspectiva, não se pode deixar de registrar que a Carta da República
estabelece como princípio fundamental a “prevalência dos direitos humanos” (art.
4º, II, CF). Esse princípio fundamental fixa uma pauta muito clara para o
intérprete/aplicador das normas infraconstitucionais e também das demais normas constitucionais.
Essa racionalidade reforça o anteriormente exposto.
Outro ponto relevante é o fato de que o
art. 2º do Pacto de São José da Costa Rica determinou a todos os signatários
que adotassem todas as medidas legislativas ou de qualquer outra natureza
necessárias para tornar efetiva a garantia dos direitos e liberdades estabelecidos
pelo próprio Pacto. (aqui).
Acrescente-se, ainda, que é princípio de Direito Internacional Público aquele segundo o qual o
signatário de um tratado não poderia invocar o direito interno como escusa para descumprir aquele. (Art. 27, da Convenção de Viena, 1969).
O Decreto federal n. 7.030/2009 (aqui),
que incorporou formalmente a Convenção de Viena ao ordenamento nacional, não
faz qualquer ressalva quanto à aplicação do mencionado artigo 27.
Não obstante, vale observar que o Brasil antes mesmo de haver formalmente incorporado a
Convenção de Viena ao ordenamento jurídico nacional sempre a respeitou com base
no costume jurídico internacional.
Por todo o
exposto, cremos que há elementos consistentes para concluir que a submissão integral do Brasil à jurisdição da
Corte Interamericana de Direitos Humanos é totalmente compatível com a
soberania nacional e com os princípios de Direito Internacional.
* corregido às 22h55min.
* corregido às 22h55min.
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